Cristina Azevedo – O Globo – 25 de fevereiro de 2010
RIO - Secretário-geral do Partido Arco Progressista e integrante do Comitê pela Cidadania Inter-racial, Manuel Cuesta acredita que o fato de Orlando Zapata Tamayo ser negro influiu nos maus-tratos e no tratamento médico precário que recebia na prisão. De Havana, ele conta por telefone que a vigilância aos dissidentes aumentou por temor a manifestações, e protesta: "Cuba é o único país da região em que um preso, seja de consciência ou comum, morre por fazer greve de fome."
Como está a situação em Cuba após a morte de Orlando Zapata Tamayo?
MANUEL CUESTA: Alguns amigos tentaram viajar até Holguín, onde a família dele mora, mas foram detidos e forçados a retornar. Outros foram impedidos de sair de casa em províncias como Cárdena. Aqui em Havana, notamos que os dissidentes estão sob vigilância da polícia política.
A mãe de Zapata disse que ele foi torturado na prisão. O que houve com ele?
CUESTA: Ele apanhou muito porque era um prisioneiro rebelde. Aqui os presos não podem protestar. Uma vez teve que ser operado devido aos golpes que sofreu no centro carcerário de Holguín. Além disso, enfrentou uma condição muito difícil nas prisões. Um local para 30 pessoas abriga 80, 100. A alimentação está sendo difícil para todos os cubanos, imagine para os presos. Eles não recebem assistência médica adequada. O governo não deixa que organismos internacionais visitem as prisões, e por isso é difícil que as penitenciárias recebam assistência de agências humanitárias. O governo não reconhece os presos políticos. Para ele, são mercenários a serviço dos EUA.
Como vê a declaração de Raúl Castro?
CUESTA: Raúl Castro lamentou a morte de Zapata, mas a classificou como o resultado do conflito com os Estados Unidos. Nós, cubanos que temos opiniões diferentes, estamos na zona de perigo. Lula deveria ter protestado. Estamos falando de valores universais, que o governo Lula defende muito bem. Essa é uma boa ocasião para se manifestar publicamente contra o governo cubano, sobretudo pela importância que isso tem para a América Latina. Cuba é o único país da região em que um preso, seja de consciência ou comum, morre por fazer greve de fome, ao pedir melhores condições. Num momento em que a América Latina discute a sua unidade, deveria se preocupar para evitar que situações como essa cheguem a extremos. Se ainda havia alguma dúvida de que a luta por direitos humanos em Cuba era legítima, essa dúvida não existe mais.
O fato de Zapata ser negro teve alguma relação com os maus-tratos sofridos na prisão?
CUESTA: Evidentemente. Um intelectual já disse que os negros em Cuba sofrem a dor e a sobredor. Historicamente, em Cuba, quando negros e mestiços protestam, são mais reprimidos. A raça vai marcá-los. Deveria ser o contrário, mas não é. O que aconteceu com Zapata, acontece com outros. Se ele tivesse um foco maior interno e internacional, sua morte poderia ter sido evitada.