sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Chapa quente em Angola

Blog do Ancelmo Gois

O MPLA, partido que está há 33 anos no poder em Angola, mandou um recado duro à ONG de direitos humanos Human Rights Watch: não se meta nos assuntos internos do país. O motivo é um relatório da organização alertando que "estão ameaçadas as perspectivas de uma votação justa e livre nas eleições de 5 de setembro no país". Para a ONG, "o governo não está cumprindo plenamente o seu dever de garantir o direito de eleições livres".

- Menos de um mês antes das eleições, está claro que os angolanos não podem fazer campanha eleitoral sem intimidações ou pressões. A não se que esta situação mude agora, os angolanos não serão capazes de exercer o seu voto de maneira livre - disse Georgette Gagnon, diretora para a África da HRW.

O MPLA respondeu de forma lacônica: não corrobora com provocações.

Eleições em risco

Angola elege um novo Parlamento no dia 5 de setembro, depois de 16 anos sem eleições - a primeira e única foi em 1992, que degenerou no recrudescimento da guerra civil e manteve no poder o presidente José Eduardo dos Santos, elevado ao cargo em 1979 com a morte de Agostinho Neto, um dos líderes do movimento de libertação, empossado presidente do país após a independência de Portugal, em 1975.

A longa legislatura de 16 anos que termina este ano deverá renovar o Parlamento em 80%, calculam especialistas da política local. Dos Santos convocou eleições presidenciais para o ano que vem, quando completa 30 anos no poder, mas ainda não anunciou se concorrerá ou não.

Para os angolanos, eleições são associadas ao trauma da guerra, ao medo, à insegurança em relação ao futuro.

Campanha que não decola

Há um mês a chefia de Polícia soltou um comunicado negando os boatos de que os angolanos seriam proibidos de sair do país. Há poucos dias, o ministro do Interior, Roberto Leal Monteiro, voltou a negar os boatos de que as fronteiras do país seriam fechadas. O diretor de Polícia Econômica, Alexandre Canelas, teve que ir a público negar as informações de que comerciantes estrangeiros estariam deixando o país, temendo conflitos pós-eleitorais, enquanto o diretor de Comércio, Gomes Cardoso, garantiu que não haverá desabastecimento nos supermercados.

Nesse clima, a campanha eleitoral não decolou ainda. As eleições são legislativas, mas o que se vê nas ruas, nos carros e nos candongueiros (as vans), são fotos e cartazes do presidente Zedu e do líder da Unita, o principal partido da oposição, Isaías Samakuva. Dez partidos e quatro coligações estão na disputa pelos 220 cadeiras da Assembléia Nacional. A Unita vem denunciando atos de intolerância por parte de militantes do MPLA.

- Sempre que realizamos uma atividade política inserida na nossa campanha eleitoral surgem indivíduos ligados ao partido do poder com aparelhos de som ensurdecedores impedindo a nossa atividade - reclamou Adalberto da Costa Júnior, secretário de Comunicação e Marketing.

Relatos que assustam

A Human Rights Watch confirma as agressões aos militantes da oposição e diz ter documentado "numerosos incidentes de violência política envolvendo apoiadores do partido no poder". A ONG também denuncia a falta de liberdade da imprensa: "Há indícios claros de que o ambiente já restritivo para a mídia em Angola se tem deteriorado desde 2007". E questiona a independência da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), cujos membros são, em sua maioria, nomeados pelo partido do poder.

Os observadores internacionais que acompanharão a votação ainda não chegaram e, segundo a ONG, começarão tarde a "monitorar as condições pré-eleitorais do terreno". A Human Rights Watch pede aos observadores que insistam junto ao governo para que tenham acesso a todos os locais de votação e a todas as etapas do processo eleitoral.

CUT quer quatro dias de salário do trabalhador

Geralda Doca - O Globo
22 de agosto de 2008

BRASÍLIA - A CUT e as maiores centrais sindicais do país vão brigar no Congresso pela aprovação de um novo tributo, em substituição ao imposto sindical obrigatório, que pode garfar até 1% dos ganhos anuais do trabalhador, o que corresponde a 13% de um salário mensal. Atualmente, o imposto sindical cobra um dia de trabalho por ano, o equivalente a 3,33% de um salário, descontado a cada mês de março de quem tem carteira assinada. Se a proposta for aprovada, o desconto nos contracheques poderá representar quase quatro dias de salário.

Em reunião das centrais nesta quinta com o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, ficou decidido que o governo enviará o projeto que cria a contribuição negocial ao Congresso, substituindo o imposto sindical e as contribuições assistencial e confederativa. No entanto, caberá ao Congresso definir a alíquota da nova contribuição. A proposta de 1% do salário anual foi levada ao encontro pela CUT, mas Lupi preferiu deixar ao Legislativo a decisão de quanto os trabalhadores vão pagar.

- Vamos enviar o projeto sem definir o valor porque não há convergência entre as centrais - disse Lupi.

"É só enviar que a CUT e a Força conseguem aprovar"

Presente no encontro, o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT), o Paulinho, presidente da Força Sindical, afirmou que as centrais conseguem aprovar a proposta com facilidade:

- É só enviar que a CUT e a Força conseguem aprovar.

O governo alega que hoje o trabalhador não tem opção e todo ano - sendo sindicalizado ou não - tem descontado o imposto a favor do sindicato da categoria. Com a proposta, justifica o ministério, ele poderá negociar o valor nas assembléias de sua categoria. Mas o caráter obrigatório do imposto será mantido, pois o percentual aprovado pelas assembléias continuará sendo pago por todos, independentemente de filiação sindical.

- Isso é justo, porque, quando o sindicato consegue aumento salarial, todos são beneficiados - justificou o secretário de Políticas Sindicais da CUT, Vagner Freitas.

O valor da contribuição negocial seria definido nas assembléias dos sindicatos, com quórum mínimo de dois terços dos sindicalizados, mas com toda a categoria tendo direito a voto.

Freitas alegou que as três contribuições atuais chegam a consumir em média 20% do salário mensal dos trabalhadores, uma vez ao ano. Especialistas da área sindical lembram, porém, que o teto de 1% defendido pelas centrais vai virar piso, pois nem todas as entidades cobram as contribuições assistencial e confederativa, e há algumas que devolvem parte do imposto descontado, como o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

A proposta inicial de Lupi era atrelar o percentual da contribuição negocial ao aumento salarial que o sindicato conseguir para a categoria, incidindo sobre um salário mensal. A idéia foi derrotada pelos sindicalistas. Perguntado se não estaria lavando as mãos ao deixar a decisão com o Congresso, Lupi disse que cumpria acordo feito com o Senado na votação da proposta do Executivo que reconheceu as centrais e lhes deu direito ao imposto sindical obrigatório

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

McCain abre vantagem de 5 pontos sobre Obama, diz pesquisa

Por John Whitesides
Reuters, 20 de agosto de 2008

WASHINGTON (Reuters) - Em uma grande reviravolta, o republicano John McCain abriu 5 pontos de vantagem sobre o democrata Barack Obama na corrida pela Presidência dos Estados Unidos e passou a ser visto como o melhor nome para administrar a economia do país, revelou uma pesquisa Reuters/Zogby divulgada na quarta-feira.

McCain está à frente de Obama com 46 por cento das intenções de voto (contra 41 para o adversário), apagando a sólida vantagem de 7 pontos registrada pelo democrata em julho e assumindo, pela primeira vez, a liderança em uma pesquisa mensal Reuters/Zogby.

A virada ocorre depois de um mês marcado por ataques lançados por McCain, que questionou a experiência de Obama, criticou o fato de o democrata opor-se à extração de petróleo em novas plataformas marítimas e ridicularizou a recente viagem dele ao exterior.

A pesquisa foi feita entre quinta-feira e sábado, período durante o qual Obama concluía uma semana de folga no Havaí, cedendo os holofotes para McCain, que se valeu da invasão da Geórgia pela Rússia para dar destaque a seus planos de política externa.

"Não há dúvida de que a campanha para abalar a imagem de Obama está pagando dividendos para McCain neste momento", afirmou o especialista em pesquisas John Zogby. "Isso representa um revés significativo para Obama."

McCain, atualmente, registra uma vantagem de 9 pontos percentuais (49 por cento contra 40 por cento) quando se trata de saber quem seria o melhor nome para comandar a economia norte-americana -- uma questão que quase metade dos eleitores disse ser sua maior preocupação para as eleições presidenciais de 4 de novembro.

Essa margem reverte a liderança de 4 pontos de Obama registrada no mês passado sobre o mesmo assunto. McCain, senador pelo Arizona e ex-prisioneiro de guerra no Vietnã, admitiu não ser muito versado em assuntos econômicos e mostrou-se mais interessado em assuntos de política externa e de planejamento militar.

O republicano partiu para o ataque contra o democrata no último mês, valendo-se da preocupação dos norte-americanos com a alta dos combustíveis. Pesquisas mostram que a maioria dos eleitores concorda com os planos dele de ampliar a extração de petróleo em plataformas marítimas neste momento em que a gasolina chega, nos EUA, a 4 dólares o galão (3,78 litros).


Obama criticou a alternativa, mas disse recentemente que concordaria com uma expansão limitada como parte de um amplo programa energético.

Essa representa uma das várias mudanças de postura realizadas nos últimos tempos pelo democrata. Mas Zogby disse que essa estratégia pode ter prejudicado Obama, particularmente entre os democratas e entre os que se consideram liberais.

"Essa pequena diferença entre nuance e o que soa como virar a casaca está prejudicando o candidato junto ao eleitorado liberal", afirmou Zogby.

O apoio a Obama entre os democratas caiu 9 pontos percentuais neste mês, para 74 por cento, ao passo que o apoio a McCain entre os republicanos ficou em 81 por cento.

Entre os liberais, o apoio ao democrata caiu 12 pontos percentuais, enquanto os liberais ainda indecisos somam 10 por cento. Os conservadores indecisos são 9 por cento.

OBAMA PRECISA FAZER TRABALHO DE BASE

"Supunha-se que os conservadores seriam o maior problema de McCain", disse Zogby. "Obama ainda precisa trabalhar com a sua base. Neste momento, McCain parece estar realizando um trabalho melhor com a base dele."

A queda no apoio a Obama, que pode se transformar no primeiro presidente negro dos EUA, aconteceu em vários grupos demográficos e ideológicos. A popularidade dele diminuiu entre os católicos, mulheres, independentes e jovens. Ele continua a ter o apoio de mais de 90 por cento dos negros.

"Não houve nenhuma reviravolta drástica. Não há nenhum grupo radicalmente diferente hoje do que há um ou dois meses. Trata-se apenas de uma constante queda sofrida por Obama em vários grupos", afirmou Zogby.


O apoio a Obama entre os eleitores com 18 a 29 anos de idade, um de seus pontos fortes, caiu 12 pontos percentuais, para 52 por cento. McCain, que completará 72 anos na próxima semana, recebeu 40 por cento dos votos dos eleitores jovens.

"Esses não são os números de que Obama precisa para ganhar", disse Zogby a respeito dos norte-americanos com menos de 30 anos de idade.

O democrata, 47 anos, continua saindo-se bem entre os jovens, um bloco fundamental para sua vitória contra a senadora Hillary Clinton durante as prévias do Partido Democrata.

Os esforços do candidato independente Ralph Nader e do candidato do Partido Libertário, Bob Barr, para colocar seus nomes nas cédulas a serem usadas em cada Estado parecem fazer pouca diferença.

McCain ainda mantém uma vantagem de 5 pontos percentuais sobre Obama (44 por cento contra 39) quando todos os quatro nomes passam a fazer parte da disputa. Barr recebia 3 por cento dos votos e Nader, 2 por cento.

A maior parte das pesquisas nacionais atribuía uma vantagem apertada para Obama contra McCain durante o verão (junho a agosto nos EUA).

Na pesquisa Reuters/Zogby, Obama registrou uma vantagem de 5 pontos em junho, pouco depois de ter conquistado a vaga de seu partido, e de 8 pontos sobre McCain em maio.

A enquete feita por telefone com 1.089 pessoas aptas a votar possui uma margem de erro de 3 pontos percentuais.

A pesquisa ocorreu no momento em que os dois candidatos preparam-se para as convenções de seus partidos nas quais oficializarão suas candidaturas e anunciarão seus vice-presidentes.

A convenção democrata começa na segunda-feira, em Denver, e a republicana inicia-se na outra segunda-feira, 1 de setembro, em St. Paul (Minnesota).

Pequenos monstros, de João Pereira Coutinho

Folha OnLine, 10 de agosto de 2008 (link original)

Confesso: tenho assistido aos Jogos Olímpicos. A culpa não é minha. A culpa é da diferença horária: quando vou para a cama, Pequim está acordado. Deitado no leito, com a tv ligada, acompanho os exercícios. E a insônia vem a seguir.

Insônia por que? Por causa dos atletas chineses. Nada tenho contra chineses. Mas é difícil resistir ao rosto dessa gente. Americanos, russos, europeus, brasileiros - tudo gente normal, com as alegrias e tristezas de gente normal. Mas os chineses são outra história: o rosto exibe uma tensão e uma infelicidade que não se encontram nos outros. E quando falham, isso não representa uma derrota para os atletas. Representa uma tragédia de contornos apocalípticos. Como explicar o fenômeno?

Infelizmente, com política. Os Jogos não são mero desporto para a China; são uma forma do regime mostrar superioridade perante o mundo (tradução: perante os EUA), vencendo mais medalhas e apresentando uma organização imaculada, onde o fogo de artifício é gerado por computador e crianças inestéticas são dubladas por rostos mais fotogênicos. Um atleta chinês, quando entra em cena, está em guerra diplomática. Perder é morrer.

Mas existe uma razão adicional e pessoal: há trinta anos que a China persiste na sua política do filho único como forma de limitar a explosão demográfica. E essa política tem um preço: quando os casais têm um único filho, a pressão e as expectativas de sucesso aumentam, esmagando os desgraçados. A China criou uma juventude admirável: pequenos monstros que jogam a existência, sua e dos progenitores, em cada prova desportiva ou académica.

A revista "Psychology Today" relembrou recentemente alguns números a respeito. Números que arrepiam. Anualmente, as universidades chinesas produzem 4 milhões de diplomados. Mas a China, apesar do boom económico, apenas consegue absorver menos de metade. O desemprego é o caminho para a maioria, isso numa cultura que nunca tolerou pacificamente o fracasso.

Moral da história? Para começar, o suicídio é a primeira causa de morte entre os chineses mais jovens (entre os 20-35 anos); e só entre os universitários, 25% têm recorrentes pensamentos suicidas (nos EUA, por exemplo, só 6%). Conta a revista que a China lidera os problemas psiquiátricos entre crianças e adolescentes, com 30 milhões a necessitar de acompanhamento psicológico, que aliás não existe: uma das heranças perversas da tirania de Mao foi percepcionar os problemas psicológicos como "anti-socialistas", enviando os "reacionários" problemáticos para campos de trabalho.

Sim, o Brasil pode lamentar as medalhas perdidas. Mas existe um prémio de consolação: os jovens brasileiros entram e saem da China com a cabeça intacta. A sanidade vale ouro.