quinta-feira, 23 de julho de 2009

Cativeiro chavista


Barinas, bastião da família do presidente, sofre com sequestros

Simon Romero 

Do New York Times

BARINAS, Venezuela. Em uma região repleta de fazendas de criação de gado, Barinas é conhecida por dois motivos: por ser o bastião da família do presidente Hugo Chávez e pela assustadora onda de sequestros, que faz da região a de maior índice deste tipo de crime na América Latina.

Uma onda de crimes que se intensificou em âmbito nacional na última década fez com que a taxa de sequestros na Venezuela ultrapassasse as da Colômbia e do México, com aproximadamente 2 sequestros para cada grupo de 100 mil habitantes, de acordo com o Ministério do Interior.

Mas nenhum lugar da Venezuela chega perto do número de sequestros de Barinas, com 7,2 casos para cada grupo de 100 mil habitantes, com as gangues armadas prosperando dentro da desordem local enquanto a família Chávez amplia seu poder no estado.

A desapropriação de fazendas de gado e a decadência da infraestrutura local também contribuem para a sensação de caos.

Barinas oferece um microcosmo único do governo de Chávez. Muitos moradores pobres ainda veneram o presidente, nascido na pobreza nesta região em 1954. Mas a polarização está aumentando em Barinas, com muitas pessoas irritadas com a recente prosperidade dos pais e irmãos do presidente, que governam o estado desde os anos 1990.

Enquanto Barinas é um laboratório para projetos como a reforma agrária, problemas urgentes como os crimes violentos passam despercebidos nos muitos outdoors que exaltam o predomínio da família Chávez.

— Isto é anarquia. Pelo menos o tipo de anarquia na qual a família de Chávez acumula riqueza e poder, enquanto nós tememos por nossas vidas — disse Angel Santamaria, 57, pecuarista da cidade de Nueva Bolívia cujo o filho, Kusto, de 8 anos, foi sequestrado quando entrava na escola em maio. O menino foi mantido em cativeiro 29 dias, até que seu resgate fosse pago.

O governador de Barinas, Adán Chávez, irmão mais velho do presidente e antigo embaixador em Cuba, disse que muitos dos sequestros resultam dos esforços da oposição para desestabilizar o governo, e também dos chamados autossequestros: sequestros orquestrados por pessoas para extorquir dinheiro de sua própria família.

Em uma eleição no ano passado, permeada por acusações de fraude, Adán Chávez sucedeu ao seu próprio pai, Hugo de los Reyes Chávez, que governou Barinas durante uma década com o irmão do presidente, Argenis, antigo secretário de Estado de Barinas.

— A cada dia que passa, Barinas é mais segura do que antes — afirmou o governador recentemente.

Através de um porta-voz, Adán Chávez recusou pedidos para uma entrevista.

As patrulhas de ideias de Chávez

Presidente da Venezuela aumenta controle sobre partido para anular opiniões contrárias

Janaína Figueiredo 
Correspondente • BUENOS AIRES

Depois de ter sido derrotado em distritos importantes tanto nas eleições regionais de novembro de 2008 como no referendo sobre seu projeto de reeleição indefinida, em fevereiro, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, decidiu reestruturar o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), na tentativa de construir uma base política forte para os próximos anos de seu governo, hoje sustentado pelo carisma do chefe de Estado. Ontem, o líder venezuelano confirmou sua decisão de eliminar os atuais batalhões do PSUV, compostos por 300 pessoas, e criar patrulhas de 30 membros, reforçando o controle direto dos cerca de sete milhões de filiados do partido fundado e comandado por Chávez.

Segundo explicou ao GLOBO o general reformado Alberto Müller Rojas, um dos principais integrantes do birô político do PSUV, “as derrotas sofridas foram consequência das falhas de nosso partido, de uma burocracia herdada de outros tempos, do clientelismo político e também da ineficiência de governos regionais anteriores”. O general, um dos principais assessores do presidente, assegurou que Chávez precisa ter um partido forte, que garanta a eficiência de seu governo.

— Precisamos de um partido eficaz, com capacidade de ação a longo prazo, e que não dependa exclusivamente da liderança carismática do presidente — disse Müller Rojas, que também revelou a intenção do governo de realizar uma reestruturação ministerial nos próximos meses. — Nossa meta neste momento é criar um verdadeiro poder popular, uma consciência social de mudança, e, nesse sentido, o PSUV precisa ajudar a resolver problemas.

Intenção é criar 200 mil patrulhas

Segundo o presidente, serão instalados 15 mil “pontos vermelhos” em todos os estados venezuelanos, que funcionarão como células do PSUV. Na verdade, Chávez espera a chegada de 200 mil patrulhas. A ideia é incentivar uma maior participação popular num momento em que a liderança de Chávez continua forte, mas o entusiasmo dos chavistas em relação ao governo diminui. O presidente assegurou na TV que as patrulhas deverão realizar um trabalho diário para “desmontar matrizes” de opinião contrárias ao “processo revolucionário”.

— Não se trata somente de vencer eleições, temos de formar uma consciência social, e para isso é necessário estar em contato direto e constante com nossos militantes — argumentou Müller Rojas.

Na visão de analistas políticos críticos do governo, a reestruturação do PSUV reforçará o perfil militarista do partido e aumentará o clima de temor entre os chavistas.

— Ninguém sabe se é verdade que o PSUV tem sete milhões de militantes, mas, se esse é o número, estimamos que 80% dos militantes são chantageados políticos, pessoas que não podem dizer não, porque temem ser punidos — disse Nicolás Toledo, da Consultores XXI.

Para ele, “o PSUV funciona com base no clientelismo político e o controle rigoroso da vida de seus militantes”.

Para Luis Vicente León, da Datanálisis, “a estrutura cada vez mais militarista do PSUV se deve à necessidade do governo de mobilizar gente, num clima de decepção cada vez maior”.

— O partido é uma máquina eleitoral que cumpre ordens. Além de mobilizar os militantes em eleições, sua segunda função mais importante é distribuir a renda petroleira de forma eficiente — afirmou Vicente León.

Segundo analistas, com a queda do preço do petróleo, o governo tem menos recursos para destinar aos programas sociais, e não quer que falhas do PSUV prejudiquem a imagem do governo nos setores mais humildes. Nas duas votações passadas, o chavismo foi derrotado em municípios pobres de Caracas por suspeitas de corrupção das autoridades locais do PSUV.

Juíza acusa Chávez e é substituída

CARACAS. Alicia Torres, juíza responsável pelo processo contra Guillermo Zuloaga, presidente da TV Globovisión, foi afastada ontem do cargo, após denunciar que foi pressionada a proibir a saída do empresário do país. A Globovisión é opositora ao governo do presidente venezuelano, Hugo Chávez, e Zuloaga, que está sendo processado por ocultar veículos de uma concessionária para supostamente fazer especulação de preços, acusa o governo de perseguição.

— Vou exercer meu direito, entrarei com uma denúncia na Promotoria contra esta medida ilegal — disse a juíza.

Alicia enfureceu o governo venezuelano ao denunciar, na sexta-feira, que foi pressionada pela presidente do Tribunal de Justiça de Caracas, Veneci Blanco, para proibir a saída de Zuloaga do país. A juíza negou ter assinado a proibição.

O governo venezuelano também move cinco processos contra a Globovisión e já ameaçou várias vezes retirar a concessão pública da TV, como fez com a RCTV. Pelo menos 240 emissoras de rádio também estão ameaçadas.

A passos largos para o socialismo

O Globo, 19/07/2008

ESTATIZAÇÕES: O projeto prevê “declarar a utilidade pública e interesse social de bens materiais e infraestruturas que possam ser declarados propriedade social, para garantir, por meio da produção socialista, a satisfação das necessidades sociais e materiais da população”.

Com isso, o Estado poderá decretar a aquisição forçada, por meio da justa indenização e pagamento oportuno da totalidade de um bem ou de vários bens declarados propriedade social, para fortalecer os programas de desenvolvimento do país.

ECONOMIA CENTRALIZADA: Será criado um Conselho Central para a Planificação da Economia Socialista, controlado pelo Executivo.

ALÍVIO FISCAL: As empresas socialistas terão acesso a programas de reestruturação de suas dívidas e serão exoneradas de pagar impostos em caso de necessidade.

INCENTIVO FINANCEIRO: O Executivo poderá pôr em andamento programas de assistência financeira preferencial às empresas socialistas.

FUNDO DE INVESTIMENTO: Será criado um Fundo Intergovernamental para a Economia Socialista, financiado em partes iguais (50%) pelo Executivo Nacional e pelos governos estaduais e prefeituras.

Acuados na trincheira antichavista

Governadores oposicionistas venezuelanos têm ação cada vez mais restrita por Chávez

Janaína Figueiredo Correspondente 
• BUENOS AIRES -O GLOBO, 19/07/2009

Depois de vencer a eleição para governador do estado venezuelano de Táchira, em novembro do ano passado, o líder do tradicional partido social-cristão Copei, César Pérez Vivas, foi impedido de utilizar o palácio de governo da capital estadual. Segundo contou o próprio governador em entrevista ao GLOBO, o palácio “foi invadido por deputados regionais do chavismo, a primeira de uma série de violações constitucionais que representam um golpe de Estado progressivo contra os governos opositores”. Na próxima semana, o governador de Táchira integrará uma missão de opositores da “revolução bolivariana” que embarcará rumo a Washington, onde pretende reunir-se com autoridades da Organização dos Estados Americanos (OEA) e do Departamento de Estado, para denunciar o que considera violações constitucionais cometidas pelo governo.

— Todos os dias enfrentamos ameaças, boicotes, atropelos. Não contamos com os recursos necessários e nossa autoridade não é reconhecida pelo governo central — declarou Pérez Vivas, de San Cristóbal, capital de Táchira.

Segundo o governador antichavista, algumas regiões de Táchira estão sofrendo problemas de abastecimento de combustíveis e alimentos.

— Estão fazendo um bloqueio econômico contra os estados governados pela oposição — assegurou Pérez Vivas, denunciando, ainda, a ocupação militar de aeroportos, colégios, clubes esportivos e organismos estaduais. — As Forças Armadas adotaram uma atitude muito agressiva e são usadas pelo governo central para controlar tudo que for possível. Isso é um golpe de Estado interno.

Diálogo é inexistente entre os dois lados

As eleições regionais de novembro foram um duro golpe político para o presidente Hugo Chávez. O Partido Socialista Unido da Venezuela, fundado e liderado pelo presidente, elegeu governadores em 17 dos 22 estados venezuelanos, mas a oposição venceu nos estados e cidades mais importantes do país, que juntos representam 45% do eleitorado e 70% do PIB (conjunto de riquezas produzidas pelo país). Além de Táchira, a oposição passou a governar os estados de Miranda, Zulia, Carabobo, Nova Esparta e a Prefeitura Maior de Caracas, onde venceu Antonio Ledezma, da Aliança Bravo Povo. Após o revés eleitoral, Chávez reconheceu a vitória opositora, em tom irônico:

— Reconheço seu triunfo e espero que eles reconheçam o chefe de Estado e a Constituição. Ao prefeito maior (de Caracas), reconheço seu triunfo. Espero que não volte ao velho caminho do golpismo.

Como era esperado, o relacionamento entre Chávez e os governos opositores se transformou numa queda-de-braço. Hoje não existe diálogo, apenas trocas de acusações e ataques pessoais. O prefeito de Caracas realizou este mês uma greve de fome, para exigir o pagamento de recursos necessários aos salários de seus servidores.

Durante o protesto, Ledezma, que também integrará a missão aos EUA, exigiu a intervenção da OEA.

— O governo Chávez está buscando limitar os governos opositores, impedir que sejamos eficientes em nossas gestões — assegurou.

A situação de Ledezma é um pouco mais complicada que a de seus colegas opositores, já que este ano a Assembleia Nacional (controlada pelo chavismo) aprovou a Lei de Distrito Federal, que criou a figura de chefe de governo do Distrito Capital, autoridade designada pelo presidente do país.

Antes da votação da polêmica lei, o prefeito maior de Caracas tinha um poder similar ao dos governadores estaduais, atuando como principal autoridade nos cinco municípios da área metropolitana da capital. Com a nova lei, o chefe de governo do Distrito Capital assumiu quase todas as suas funções e bens públicos.

— O governo aprovou um projeto já rechaçado nas urnas, no referendo sobre o projeto de reforma constitucional chavista, em dezembro de 2007 — acusa o prefeito maior.

Segundo ele, que entrou na Justiça para tentar anular a nova lei, “o governo montou um esquema perverso para boicotar as autoridades opositoras, eleitas legitimamente”.

— Ocupam escritórios, assumem o controle de áreas que deveriam ser controladas pela oposição e violam constantemente as normas internas do país — dispara Ledezma.

O governador do estado de Miranda, Henrique Capriles Radonski, do partido Primeiro Justiça, acusou semana passada o governo chavista de provocar incidentes violentos em seu estado. O governador se referia à ocupação por parte da Guarda Nacional de uma sede do comando policial de Curiepe. Houve vários feridos.

— É um plano premeditado. Existe a intenção de fazer algo que ainda não sabemos o que é — declarou Capriles Radonski.

Para os governadores opositores, o objetivo de Chávez é criar um clima de ingovernabilidade, que os obrigue a renunciar.

— Estamos sofrendo uma escalada autoritária e não podemos denunciar porque os juízes têm medo do governo — lamentou Pérez Vivas. — O que diremos em Washington é que presidentes eleitos também podem ferir a democracia e a comunidade internacional deve estar atenta.