Barreiras no Alto Gávea e em Jacarepaguá conseguiram impedir o avanço de favelas sobre áreas verdes
Ediane Merola, Gustavo Goulart e Paula Autran, O Globo, 17 de abril de 2009
Discutida como novidade, a polêmica instalação de muros entre favelas e áreas verdes já é uma realidade concreta na cidade. Tanto o poder público quanto a iniciativa privada já ergueram barreiras para conter a expansão de comunidades irregulares no Rio. Há 25 anos, por exemplo, um grupo de moradores do Alto Gávea patrocinou a construção de um muro de 500 metros de extensão, que até hoje impede a Rocinha de cercar completamente o Morro Dois Irmãos.
Também na década de 80, o então prefeito Marcello Alencar inaugurou um muro no Morro da Chacrinha do Mato Alto, em Jacarepaguá. A barreira ainda serve de limite para a comunidade, que aprova a medida como forma de preservar o meio ambiente e levar mais segurança para os moradores das favelas.
Segundo dados do Instituto municipal Pereira Passos (IPP), de 1999 a 2008, a Rocinha cresceu 12.063 metros quadrados (passando de 852.968 a 865.032 metros quadrados ocupados). Já a Chacrinha do Mato Alto ficou 7.693 metros quadrados maior (a ocupação foi de 71.153 para 78.846 metros quadrados).
Diretor de Urbanismo da Associação de Moradores do Alto Gávea, o advogado Luiz Fernando Gabaglia Penna foi um dos que colaborou para a construção da barreira na Rocinha.
O muro, de três metros de altura, começa na Rua Sérgio Porto, na Gávea, e vai até o rochedo do Morro Dois Irmãos. Segundo ele, a barreira foi erguida, na época, a cem metros de distância das construções, que atualmente já fazem divisa com a parede. Por causa do crescimento da mata, hoje não é mais possível ver o muro, mas apenas o limite criado entre a favela e o verde.
— Era a época do governo de Leonel Brizola, que lançou o programa “Cada família, um lote” para a regularização fundiária de áreas de favela. Prevendo que a Rocinha iria se expandir por ali, fizemos reuniões, inclusive com representantes da Rocinha, e decidimos nos cotizar para construir o muro. Na época, deve ter custado algo em torno do equivalente hoje a R$ 500 mil. Contratamos os próprios moradores da comunidade para construí-lo — conta Luiz Fernando, acrescentando que a ideia de erguer o muro surgiu de um caso parecido na Chácara do Céu, no Alto Leblon: o empresário Antônio Galdeano havia construído algo semelhante para proteger o Parque da Cidade. Só que o terreno passou para a prefeitura na época em que Luiz Paulo Conde era prefeito, e foram abertas algumas passagens.
Na favela como ‘num condomínio fechado’
Luiz Fernando acrescenta que, de três em três anos, o muro da Gávea passa por obras de conservação, sendo que no primeiro governo Cesar Maia, quando o hoje ministro Alfredo Sirkis era secretário de Meio Ambiente, a prefeitura chegou a bancar alguns reparos necessários. Da casa do advogado não é mais possível observar o muro, que ficou registrado em fotos da época da construção. As imagens mostram burricos carregando os tijolos usados na barreira:
— Dizer que o muro é para separar ricos e pobres, que ele segrega, é loucura. O objetivo é preservar o meio ambiente. Quem diz o contrário é demagogo de gabinete, gente que nunca subiu numa comunidade. A cidade é toda dividida. Minha casa é cercada de muros. E as comunidades precisam de limites até para os governos investirem em saneamento, transporte. Sem controle, o projeto feito hoje fica defasado no dia seguinte — diz Luiz Fernando.
Na Chacrinha, o presidente da Associação dos Nordestinos do Brasil, Rozemberg Alves do Nascimento, fala em nome da comunidade e se diz a favor da construção de limites em favelas que, segundo ele, servem para cuidar do bem-estar dos moradores. Rozemberg acredita que o muro tenha mais de 480 metros de extensão e 2,10 metros de altura.
— O muro limita a comunidade, traz mais segurança, preserva o meio ambiente. Sintome num condomínio fechado — diz Rozemberg.
Na Fazenda Mato Alto, também em Jacarepaguá, a prefeitura criou uma ecobarreira, formada por casas da própria comunidade, pintadas de verde. Novas construções, dentro do limite, têm que passar pela aprovação da associação de moradores do local, presidida por Maria Ivonete Santana Madureira. Ela defende a limitação das favelas, mas diz que o poder público deve, em contrapartida, oferecer um programa habitacional adequado para as populações carentes.
— Além de controlar o crescimento, o governo tem que oferecer os serviços básicos para a população. A Rua Um, por exemplo, está sem iluminação. Já fizemos cinco protocolos na Rio Luz e ainda não conseguimos resolver o problema — acrescenta Ivonete.
Nenhum comentário:
Postar um comentário