O Globo
29 de setembro de 2008
Constituição dá superpoderes a Correa e aumenta intervenção do Estado na economia
O presidente do Equador, Rafael Correa, obteve ontem a maior vitória política desde que foi eleito, com a aprovação em referendo da nova Constituição. A nova Carta dá superpoderes a Correa e aumenta a intervenção do Estado na economia, principalmente em setores estratégicos, como petróleo e telecomunicações. Pesquisas de boca-de-urna, cujos resultados foram reconhecidos por governo e oposição, indicam que o "sim" ganhou com cerca de 70% dos votos enquanto o "não" teve 25%. O presidente, que acompanhou a votação na cidade opositora de Guayaquil, disse que os resultados marcam uma reforma no Equador.
- Este foi um dia histórico para o povo do Equador. Todas as pesquisas, encomendadas por governo e oposição, apontam para uma vitória com ampla margem. Poderemos agora implementar as reformas que são tão importantes para o desenvolvimento do nosso país - disse o presidente, em meio a uma festa feita por partidários do "sim" para comemorar a vitória.
A nova Carta é um projeto pessoal do presidente, que foi o principal cabo eleitoral do "sim" durante a campanha do referendo. Ela aumenta os poderes de intervenção e participação do Estado em setores vitais da economia - petróleo, mineração e telecomunicações -, dá ao presidente superpoderes para gerenciar a política monetária e regulamenta a reeleição. Pelas novas leis, Correa pode dissolver o Parlamento, convocar novas eleições gerais, candidatar-se e ter direito a mais uma reeleição, o que faz com que possa permanecer no poder até 2017. Com a vitória, Correa consegue o que seu principal aliado, o presidente venezuelano Hugo Chávez, tentou primeiro, mas sem sucesso. Chávez teve seu projeto de uma nova Constituição derrotado em referendo no ano passado.
Ex-aliados se reconciliam com presidente
O dia de votação foi tranqüilo em todo o país, apesar de a maior parte das urnas só ter começado seus trabalhos com quase uma hora de atraso. A campanha para o referendo foi suspensa na quinta-feira, quando a lei seca foi instaurada no país. Desde então, mais de mil pessoas foram presas por desrespeitarem as leis eleitorais. Segundo observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA), não ocorreram incidentes que comprometam os resultados. Mas o clima político no Equador virou o principal alvo de preocupação da missão.
- Apesar da organização da votação, o que observamos no país é um clima crescente de polarização, que pode se tornar ainda mais intenso daqui para frente. O que peço é que governo e opositores sentem-se à mesa para respeitar os resultados e também para chegar a um acordo nacional que beneficie a todos - disse o chefe dos observadores da OEA, o chileno Enrique Correa.
O presidente, que chegou a perder parte de sua base política durante os trabalhos da Assembléia Constituinte e temeu pelo não cumprimento do prazo para o término dos trabalhos, saiu revigorado politicamente do pleito. Com respaldo popular, conseguiu novamente atrair antigos aliados, importantes para sua coalizão, e que nos últimos meses haviam se afastado. O principal deles é Alberto Acosta, ex-presidente da Constituinte e considerado um dos principais articuladores políticos do governo. Três semanas antes do fim dos trabalhos de redação do texto constitucional, Acosta renunciou ao cargo e se afastou de Correa, despertando temores de divisão entre os principais governistas. Ontem, votou ao lado do presidente.
- Renovo meu compromisso de trabalhar pelo país e digo que a vitória no referendo é de extrema importância para todo o povo - disse ele que, segundo a imprensa, deve voltar a ocupar um cargo no governo.
Já a oposição, que contava com a derrota mas não esperava um resultado tão negativo, sai do referendo desgastada politicamente e temerosa de que a nova Constituição resulte em prejuízos para vários setores empresariais do país.
- O governo vai implementar reformas que só vão resultar em atraso e estagnação econômica. Tudo isso que estão fazendo é um retrocesso - disse Jaime Nebot, prefeito de Guayaquil, a maior cidade do país.
A nova Constituição precisava de 50% dos votos mais um para ser aprovada. Os dados oficiais da contagem de votos só devem ser divulgados em três semanas.
Esta será a 20ª Constituição da História do Equador, que tem uma nova Carta a cada nove anos, em média. O país é um dos menores e mais instáveis da América do Sul, mas com importância estratégica por causa do petróleo. Os 130 constituintes responsáveis pela nova Carta, a maioria governista, trabalharam por quase um ano em sua elaboração.
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